Um movimento muito comum na clínica de psicoterapia, são os pais trazerem seus filhos dentro de um pacote de queixas e com um rótulo nesse pacote com a seguinte pergunta: “onde foi que eu errei? ”
Durante a entrevista inicial com o responsável pela condução da criança ou do adolescente ao consultório, mostram-se ansiosos e inseguros. Muitos dizem de primeira: ‘trouxe meu filho para se consultar, não entendo por que eu tenho que participar das sessões, o problema é ele, não eu”. E por fim, se entregam com as clássicas “eu fiz de tudo por ele”; “sempre fiz o que ele quis”; ou também, “eu dei para ele tudo o que eu não tive a oportunidade de ter”…
Ele ou ela, geralmente tornam-se frutos de uma tentativa inconsciente de conquistar nossos objetivos sonhados e não conquistados. Assim, de forma inconsciente, projetamos nos filhos nossos desejos e sonhos não realizados. Podemos observar isso no filme Cisne Negro, onde a mãe, que tentou ser uma grande bailarina, agora através da superproteção, pressiona a filha a se tornar a grande bailarina que ela não foi.
Por vezes, no momento oportuno, pergunto aos genitores: vocês alguma vez já perguntaram ao(a) filho(a) o que ele(a) gostaria de ser?
Como por vezes de forma consciente se diz: filhos são para o mundo.
Não adianta temer o mundo e colocar o filho num domo.
Se eles não passarem por experiências frustratórias, não obterão capacidades resolutivas de situações-problemas. Isso repercutirá nas experiências futuras, como acadêmicas e no mercado de trabalho, além das relações interpessoais e afetivas, por fim, até na constituição familiar.
O amadurecimento emocional é a constituição gradativa da capacidade de um indivíduo de ser si mesmo, de cuidar de si mesmo, de suportar e elaborar falhas e decepções, de reconhecer que o outro pode ser e pensar diferentemente de si, bem como ter capacidade de se relacionar responsavelmente com o ambiente, de viver uma vida e ver sentido nesta (Araújo, 2007, p.147).
Filhos não empoderados resultam em filhos frustrados. Principalmente em relação à negação. Pais com dificuldades em dizer não, fazem com que no futuro os filhos tenham grandes dificuldades em receber nãos. Sejam eles numa relação interpessoal ou afetiva ou numa entrevista de emprego, por exemplo.
Isso pode levar a situações de baixa tolerância à frustração, podendo ocasionar um movimento de fuga para vícios como álcool ou drogas, como modo de superação ou para procurar não entrar em contato com essas decepções.
O importante é sempre procurar saber o que os filhos esperam deles próprios e como os pais podem contribuir para isso.
O diálogo entre pais e filhos devem ser sempre necessários, saudáveis e empáticos.
Se criarmos um canal de contato, confiança e empatia com os filhos, sem julgamentos, sem cobranças excessivas e sem desprezo às suas idéias, talvez faremos com que os filhos não tenham segredos ou coisas para esconder.
Esse movimento de confiança faz com que os pais não sejam os últimos a saber de alguma situação que necessitariam estarem à parte.
É um grande desafio, porém quando bem feito trás para si grandes recompensas.
Bons pais tornam-se incrivelmente desnecessários com o passar das primaveras. Isso não significa rompimento, mas empoderamento. Quando se torna consciente que o necessário foi realizado e caminhar com as próprias pernas é o essencial. Medos, expectativas, angústias, decepções ainda ocorrerão, pois esse é um movimento da vida. Porém cada vez mais fortalecido e empoderado, as situações em que os filhos terão que passar, não se tornarão traumas ou profundas melancolias, dando lugar ao aprendizado e ao fortalecimento emocional.
Se o trabalho com os filhos for correto, temos que nos tornar gradativamente desnecessários, dando espaço às experiências próprias em outros ambientes, além do núcleo familiar.
Um pedido de apoio é sempre bem-vindo, desde que esse apoio não pegue para si o contexto resolutivo da situação que seria própria a cada um.
Que o amor dos pais não provoque vícios e dependências. Devemos fazer com que o empoderamento dos filhos os deixem confiantes e independentes.
Que eles possam traçar suas próprias escolhas, errar, fazer e refazer planos, conquistas, metas e sonhos.
Às vezes, menos é mais!
Referências consultadas:
Araújo, C.A.S. (2007). Uma abordagem teórica e clínica do ambiente a partir de Winnicott. Tese de Doutorado, Pontifica Universidade Católica, São Paulo.
O filme: “Cisne Negro”: alguns comentários. MEDIOLI, Cristina Gaoni. Reverso [online]. 2011, vol.33, n.62, pp. 43-46. ISSN 0102-7395.