Um filme de 2012, com direção de Lynne Ramsay, narra a história de uma mãe executiva que teve uma gravidez indesejada, ocasionando uma nítida rejeição durante o período de gestação e na fase do nascimento e amadurecimento do bebê.
O filme todo tem sequências atemporais, mesclando cenas do presente e do passado, como forma de organizar o enredo para o que vai acontecer ao final.
No presente, Eva tenta se refazer dos traumas do passado. Voltar a ter uma vida produtiva e feliz, quando ao mesmo tempo as lembranças de uma tragédia e suas consequências lhe causam pesadelos diários.
De forma inconsciente, lutou durante o parto rejeitando dar a luz. Teve depressão pós-parto e depois extremas dificuldades em cuidar do bebê, dar afeto, proteção e carinho.
Absorta quanto aos devidos cuidados maternos no desenvolvimento e demonstração de amor e afeto ao bebê, Eva acaba de forma inconsciente provocando reações futuras deste bebê quando o mesmo se torna adolescente.
Suas ambições profissionais fizeram com que desprezasse e rejeitasse sua cria. Ela só não sabia das consequências.
Quem explica essas consequências, a etiologia do que aconteceu e nos ensina sobre a relação transferencial mãe-bebê, é o pediatra inglês Donald Woods Winnicott. O teórico, tornou-se Psicanalista em virtude de suas convicções, derivadas de anos de prática clínica, de que a maior parte desses problemas são frutos de dificuldades emocionais primitivas na vida de um ser humano.
Winnicott, nos fala da extrema importância do ambiente na etiologia dos transtornos psíquicos. Um ambiente não acolhedor resulta em falhas no processo de amadurecimento pessoal do indivíduo.
Desde o útero já existe um ser humano capaz de experiências, de sentir sua mãe e o modo como recebe afeto por ela.
Falhando ou desprezando, como vemos no filme, a mãe faz com que a criança crie uma organização defensiva que impede seu pleno desenvolvimento.
Com isso se desenvolverá geralmente na adolescência ou no início da fase adulta uma repercussão de todas as angústias que o bebê teve na sua relação com o ambiente que deveria protegê-lo em seus primeiros anos de vida.
Acaba ocorrendo uma cisão do Ego e um funcionamento psicótico se estabelece. Isso como uma organização defensiva contra experiências traumáticas provocadas pelas falhas desse ambiente.
Nos primeiros anos de vida do bebê, a mãe deveria entrar num estágio chamado por Winnicott, de estado de “preocupação materna primária”, em que a mãe, quando saudável, possui uma condição psicológica especial, de sensibilidade aumentada e de total devotamento ao bebê. Isso não vemos no filme, vemos as consequências da falta desse estado materno.
O bebê não sendo correspondido, amparado e amado pela mãe, sente-se ameaçado em sua continuidade de ser, o que o leva a sentir fortes agonias. Com isso ele cria defesas para evitar novas agonias. No curso de seu desenvolvimento, geralmente, como no filme, seu Ego cindi, se desintegra gerando distúrbios psiquiátricos, sendo o pior deles a Psicose, ou a própria Esquizofrenia, que é um tipo de Psicose.
É muito comum que distúrbios mais graves sejam formados na base de falhas da provisão ambiental. Notamos no filme a mãe absorta em pensamentos e ausente quanto a afetividade dada ao bebê, que por menor que seja, sente uma grande agonia e ansiedade.
Isso gerará repercussões futuras, assim como ocorreu no filme.
O bebê sofreu uma ausência de sentir-se real, ficou extremamente ansioso e angustiado e em determinado momento da sua vida cobrará daqueles que lhe são próximos a falta de afeto e provisão ambiental.
Lembrando que esse é um movimento inconsciente, independentemente de qualquer vontade própria.
Que possamos perceber o quanto a maternidade deve ser responsável, sadia e inteiramente dedicada ao bebê e ao seu amadurecimento pessoal.